terça-feira, 5 de abril de 2022

minha mãe derruba a casa da mentira



Minha mãe é quem derruba a casa da mentira

e basta. 


Por um tempo senti que não devia confiar em nada, nem ninguém.

Fui uma criança que volta e meia era pega na mentira.

Mas aí Oyá começou a me dar jeito de ver dentro do olho 

dentro do sonho

dentro 

e eu já não minto ou sinto medo.

Porque o que precisar ser desfeito, Oyá vai me mostrar,

o que eu precisar compreender, Oyá vai me mostrar,

de onde eu precisar partir, Oyá vai mostrar...


Nascemos na guerra,

e eu não preciso deixar de confiar nas pessoas,

porque confio em orixá. 

Por isso posso amar. 

Porque é minha mãe quem derruba a casa da mentira

e basta.


As vezes meu olhos estão anuviados, e não consigo ver... 

não é simples o trabalho de limpar o coração e estar atenta aos sinais,

com olhos iluminados não de claridade,  mas de horizonte.


A guerra me fez achar que não podia confiar em ninguém,

terrível sensação... 

Na frieza achei conforto. 

Esse prazer de não se ver espelhado no outro.

Minha mãe veio e dançou comigo,

disse que eu podia pisar firme, 

olhar no olho.

Meu coração estava duro,

todo desenhado de cicatriz,

então, 

Oyá veio e cantou pra mim. 




(Maíra,  "Notas sobre amor e guerra")













segunda-feira, 4 de abril de 2022

 


sem o temor iminente das cinzas,

viver o fogo 

e a paz de queimar.